
Isso é sobre você e suas relações.
Com que frequência conseguimos encarar quais são as ilusões que nos apegamos para evitar a vivência de estados sombrios?
Vamos falar sobre expectativas
O outro vai me ajudar a saber o que devo fazer, o outro vai entender o que quero dizer, o outro vai entender o que desejo, o outro vai…
É comum nutrirmos expectativas ao nos relacionarmos com o mundo exterior (seja com pessoas ou instituições). Você sabe dizer quais são as suas?
Exemplo: você espera receber cuidado, afeto, reconhecimento de seu valor, segurança, validação, etc. Porém, acabará percebendo que enquanto você não souber se relacionar consigo mesmo dessa maneira que almeja se sentir na relação com o outro, não sentirá satisfação em seus encontros com o meio.
Dores primitivas que remontam à criança ferida, vazios que te acompanham e você nem sabe desde quando, experiências e/ou mensagens entendidas sobre as pessoas, entre outros fatores, exerceram forte influência no seu processo de aprendizado sobre essa e tantas outras áreas da vida. Assim, em seus dias atuais pode ser bastante difícil assimilar sozinho a sua psicodinâmica e enxergar como ela atua em seus comportamentos e pensamentos.

Nesse contexto você pode acabar exigindo demais daquele com quem se relaciona, esperando que este resolva um problema que não é dele. A postura intransigente, inconscientemente adotada como forma de defesa para negar suas tarefas individuais, acabará causando sofrimento a você e àqueles com quem convive. Por conseguinte, você mesmo é quem acabará tendo que se olhar em suas mágoas ao notar que suas expectativas não serão atingidas.
Portanto, tudo aquilo que você nega em si mesmo se apresentará repetidamente em sua vida sob a forma de decepções ou desilusões até que você se abra verdadeiramente para se olhar com honestidade e humildade. Como essa decepção tem a ver com seus pontos cegos? O que deseja fazer com isso? Essa é a sua caminhada.
A pessoa que fere é também alguém que foi muito ferido. Como isso aparece dentro da relação com alguém? Vou falar sobre a parte que lhe cabe:
Porque apesar de ser fundamental reconhecer aquilo que te pertence, é necessário que não se esqueça de que nenhuma relação se inicia e se mantém de modo unilateral. Ambos são coniventes com o que acontece, mesmo que de modo inconsciente.
De acordo com Jung: “A experiência do Eu é sempre uma derrota para o ego”.
Se não houver atenção a si mesmo enquanto alguém que ainda está se conhecendo, falhando e aprendendo, se torna inviável entender quem se é integralmente. Somos pessoas que se impactam através do outro, mas que também impactamos os que nos cercam da mesma maneira.
Somente haverá evolução da consciência através da aceitação e posterior ressignificação dos estados sombrios que residem em sua alma.
Voltando à parte que lhe cabe: Entender que alguém que fere é alguém que conhece esse tipo de dor faz diferença para lidar com as situações que nos trazem ressentimentos. Nos ajuda a sermos empáticos com o outro e também a trabalhar a nossa autocompaixão. Somos todos humanos e é possível mudar a partir de experiências negativas.
Como disse Clarice Lispector, “Cada pessoa é um mundo”, com a sua própria história de vida, criação, vivências, modo de sentir e entender as pessoas. Se não houver respeito e consideração mútuos se torna insustentável manter as relações de convívio de maneira saudável.
O desafio reside em buscar compreensão por meio da seguinte pergunta: Como se responsabilizar por comportamentos e escolhas que você acredita terem sido guiados pelo que os outros lhe causaram? “Só fiz isso porque fulano me provocou”. “Reagi daquela maneira porque fulano me fez entender que…” Então você recai em uma prisão, não é mais dono de suas próprias ações ao se submeter ao que acha que alguém lhe fez fazer.
Fazer escolhas faz parte do processo da vida e estamos o tempo todo decidindo o que fazemos por meio de nossa liberdade individual.
E aí é importante força interna e honestidade para responsabilizar-se pelos danos e/ou impactos que você causou a alguém a fim de adquirir uma maior consciência acerca de si mesmo e de suas tarefas enquanto indivíduo. O que disso resultará enquanto resposta do outro não está em suas mãos.
Aceitar a responsabilidade por aquilo que fez, mesmo que de modo inconsciente, não é nem um pouco fácil e muito menos simples. É preciso maturidade emocional, vontade e coragem, pois ao abordar essa questão adentramos em um terreno que pode conter traumas e memórias negativas. Neste complexo solo, pouco a pouco serão abordados temas sobre como surgiram e se organizaram as defesas psíquicas que garantiram a preservação da vida interior da pessoa que vivenciou situações sentidas como esmagadoras de sua alma. A vida exterior seguiu adiante, porém, com um custo interior desconhecido.
Por isso, a tendência é usar tudo o que se tem, com todas as forças, para mascarar os próprios defeitos e fugir de suas falhas para evitar a qualquer custo o contato com o seu aspecto sombrio.
É um trabalho que precisa ser conduzido com muito cuidado, sensibilidade e ética, pois o aprendizado acontecerá com tempo e paciência, respeitando a capacidade psíquica de cada pessoa.
A trilha vai te demandar e é por isso que você não precisa suportar tudo sozinho.
Afinal, os aprendizados não acontecem logo de cara no processo psicoterapêutico.
Como diz Jung: “A psicologia só pode ajudar a fornecer o insight. Depois disso, vem a coragem moral de fazer o que precisamos e a força para suportarmos as consequências”.
É mais fácil deixar para depois o se encarar em sua própria existência do que chegar aos porquês e aos para que dos sintomas, reações, distúrbios, transtornos, somatizações, complexos, projeções… No entanto, por mais que você consiga se manter distante desse encontro consigo mesmo (e isso pode perdurar por anos e até décadas), tais sofrimentos seguirão te acompanhando (silenciosamente ou não) e só poderão ser tratados quando você escolher se abrir para si.
Se você deseja viver uma vida com SIGNIFICADO é fundamental que abandone certas ilusões e se permita dialogar honestamente com o seu verdadeiro Eu em toda a sua luz, mas também em seu lado sombrio. Todos temos esses dois lados.
O trabalho na psicologia analítica abarca aprender diariamente a suportar certos pesos e encontrar contrapesos para que você consiga descobrir quem é em sua totalidade, assim como qual é a caminhada que deseja sustentar em prol de sua autenticidade.
Não se preocupe em chegar ao entendimento do todo e atingir a capacidade de suportar dores que são demasiadamente pesadas de uma vez só. As idealizações alimentadas pelo pensamento imediatista apenas te trarão uma carga que você não precisa carregar.
Entenda: Você será suficiente ao compreender somente aquilo que for possível para você naquele momento. Nos tornamos conscientes de nós mesmos cobrindo um pequeno trecho por vez. O trabalho precisará acontecer por meio da paciência e persistência.

É uma parte de cada vez, no seu tempo. Sessão a sessão.
Começar a terapia é um ato de valorização de si mesmo. Persistir nela é um ato de coragem.
Laura Sato

